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Não precisa usar adesivo?

Boa Noite,

 

A demanda de tempo e o fim do ano infelizmente me fizeram deixar o SMARTODONTICS um pouco de lado, o que me deixou meio triste, pois eu estou gostando desse meu projeto de escrever e compartilhar.

Hoje, voltando de João Pessoa, após dar um curso de 3 dias para a turma de especialização da ABO de lá, finalmente encontrei algum tempo para voltar a escrever.

Durante o curso, que por sinal foi muito bom (os alunos foram muito aplicados, interessados e atenciosos), uma coisa me chamou atenção durante o “hands-on” de colagem de bráquetes.

Eu estava demonstrando o posicionamento dos laterais inferiores (que eu costumo colar dando inclinação distal de raiz) quando vi, sobre a mesa, uma resina ortodôntica que “supostamente” não necessita de adesivo. Eu sabia dessa dita cuja porque já havia visto alguns dos alunos de Araraquara utilizando-a e achando que estavam economizando; um, por ela ser mais barata e dois, por “não precisar de adesivo.”

Perguntei:

“Eu estou vendo vocês colarem os bráquetes nos modelos sem adesivo, mas vocês sabem que no paciente é necessário que se use um adesivo, né (sic)?”

A resposta foi a mesma dos meus alunos da Morada do Sol:

“Mas nas instruções dessa resina diz que não precisa.”

Ai, fiquei preocupado…pois a história da resina mágica estava se espalhando pelo Brasil. Eu então, expliquei para eles e tive a ideia de também fazê-lo para vocês, colegas leitores do Smartodontics, do porquê “PRECISA”.

 

A resina composta é feita a partir de componentes orgânicos (Bis-GMA), inorgânicos (sílica, quartz e outros) e de um agente de união (silano). A resina que utilizamos normalmente para a colagem de acessórios é uma pequena modificação da resina utilizada em restaurações, pois a última tem uma quantidade relativamente grande de compostos inorgânicos para dar a resistência necessária a uma restauração estável. O problema da alta concentração desses compostos, de maneira geral, é que a resina fica com um baixo potencial de escoamento dando a ela uma alta viscosidade (relativa, é claro).

O que ocorre é que a capacidade da resina permear o esmalte, desmineralizado por um ácido, fica dificultada. Assim, torna-se necessário a utilização de uma camada (extra-fina) de um composto bem menos viscoso (uma resina com pouco ou nada de carga inorgânica) para obter-se uma boa penetração ao esmalte antes da aplicação da resina composta sobre o dente.

Na ortodontia, uma resina de alta viscosidade impossibilita um escoamento adequado à malha dos bráquetes, diminuindo a sua resistência às forças mastigatórias e ortodônticas. Uma resina de baixa viscosidade, como é o caso das resinas “flow”, as quais possuem uma baixa quantidade (relativa) de compostos inorgânicos, pode ter um bom escoamento à malha dos bráquetes, mas leva a dois problemas. Primeiro, a resina fica menos resistente, tornando-se inadequada à colagem ortodôntica (como já mostrado na literatura, com aproximadamente metade da força de adesão de uma resina ortodôntica convencional), e segundo, os bráquetes deslizam durante a colagem, o que torna o posicionamento de acessórios um pesadelo em algumas clínicas.

Portanto, uma resina com média viscosidade é a ideal para a colagem ortodôntica. O problema é que não é fácil (e muito menos barato) produzir uma resina com uma quantidade suficientemente alta de compostos inorgânicos (o que torna a resina cara) e que tenha viscosidade adequada para penetrar na malha dos bráquetes, e que finalmente, ao mesmo tempo, mantenha os bráquetes em posição durante uma colagem. Algumas companhias estrangeiras conseguem produzir tais resinas e estas são as resinas de escolha na ortodontia, elas são poucas e relativamente mais caras.

Relembrado esse assunto, vamos a história do adesivo.

Ainda que uma resina de média viscosidade penetre na malha dos bráquetes, ela não consegue fazê-lo adequadamente no esmalte condicionado e, portanto, precisamos de um adesivo que o faça. Assim, pode-se obter uma colagem adequada, já que a literatura mostra que a força de adesão é menor quando o adesivo não é utilizado junto a resinas ortodônticas.

Mas não adianta diminuir a quantidade de carga da resina, tornando-a menos viscosa na intenção de pular a fase do adesivo (e tentar enganar o ortodontista desavisado), pois além dela ficar menos resistente em sua estrutura, a força de adesão também diminui. Até mesmo as resinas “flow”, que possuem uma baixíssima viscosidade mostram diferenças significativas de adesão quando adesivo é ou não utilizado.

Na minha honesta opinião, eu acho que a “vantagem” de não usar adesivo e ter uma resina ruim não é nada inteligente.

Portanto, HOJE, com as resinas que temos disponíveis para a colagem de bráquetes É NECESSÁRIO o uso de adesivo.

Resta portanto, aos fabricantes desses novos (ou velhos) materiais mostrarem resultados científicos que comprovem sua “bula”…mas acho que prefiro concluir com as palavras do Dr. Peter Buschang:

 

“Where does it say that these (orthodontic) companies can’t lie?”

 

Um abraço,

 

R.Martins


2 Comentários

  • Responder Eugenio |

    Boa Noite dr Renato . ja estava sentindo falta das suas otimas dicas. Esta resina que esta mencionando ,acredito que seja a que estou usando.Depois de algum tempo percebi a necessidade de usar o adesivo . Li estes dias um artigo comparando a mesma com a transbond e o resultado foi semelhante……………??????

    • Responder Dr. Renato Renato Parsekian Martins |

      Bom Dia Eugênio,

      Realmente, eu fiquei meio sem tempo esse fim de ano. Obrigado por sempre acompanhar.

      Não sei a qual trabalho você se refere (tem pouquíssimos no pubmed com resinas tupiniquins), então não sei se as resinas as quais eu me referi são as mesmas. Portanto não posso opinar na sua validade.

      Trabalhos de cisalhamento são aceitos com muita cautela por revistas indexadas com QUALIS elevado (eu por exemplo sou muito criterioso quando reviso um trabalho de cisalhamento), e pelo mesmo motivo precisamos lê-los atentamente para averiguar a validade interna e externa dos resultados e se eles podem ser comparados com a literatura (isso é se a metodologia é a mesma). Nesses trabalhos temos que checar, entre várias outras coisa, se (e você pode fazer isso no trabalho que você tem em mãos):

      – O esmalte está intacto? Os dentes foram estocados corretamente?
      – Os procedimentos realizados para os grupos são os mesmos? Houve padronização?
      – O adesivo utilizado foi o mesmo? Ou cada grupo utilizou o seu adesivo?
      – Os resultados se comparam com a literatura já existente e de qualidade alta?
      – Se não se comparam, existe uma explicação plausível para isso? Quem está certo? A literatura já publicada ou esse novo resultado?
      – A estatística foi feita corretamente?
      – A variabilidade dos resultados é alta? Existe desvio padrão ou erro padrão acompanhando as médias?
      – O escore de remanescente (ARI) foi descrito para os grupos? (Quanto foi a quantidade de resina remanescente no bráquete ou no dente)
      – Houve diferença de ARI entre os grupos?

      Cada um desses itens pode alterar os resultados ou a apresentação dos mesmos e tornar um trabalho inválido. Espero que com essas perguntas você possa avaliar a qualidade do artigo que você tem em mãos. 🙂

      Entretanto, o propósito do post foi elucidar o tema entre usar ou não o adesivo, e a literatura é clara nesse respeito a favor da utilização de adesivo (sem contar que a lógica da dinâmica de funcionamento de compômeros também aponta para esse lado). A crítica nas entrelinhas foi feita às empresas que inventam informação a fim de enganar o dentista que não lê. Assim, o meu propósito não foi dizer se uma resina é melhor que outra, a literatura (a maioria esmagadora dos artigos publicados, indexados e de QUALIS A/B internacional) já tem bem estabelecida qual é a resina padrão ouro na atualidade.

      Obrigado por sempre comentar!

      Abraço,

      R.Martins

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