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O Dragão da garagem de Carl Sagan

“A fé cega em experts é a maior inimiga da verdade”

A.Einstein

 

Boa Noite,

 

Ainda hoje, a discussão entre ciência e fé perdura: De um lado há os que tem uma verdadeira vontade de saber mais, de adquirir conhecimento, de descobrir, que utilizam métodos controlados para solucionar suas dúvidas…do outro estão aqueles que sabem o que se passa, devido a um conhecimento inatingível aos outros mortais ou devido ao conhecimento repassado por um guru, de conhecimento inatingível tmbém.

Quando menciono essa discussão, eu não me refiro à crença em Deus ou em uma entidade qualquer, me refiro a fé que está entremeada na nossa prática do dia a dia, que deveria ser baseada em evidências científicas e não em achismo. Me refiro à fé de alguns colegas em acreditar que alguém, algum procedimento ou algum acessório poderia suprir a sua falta de conhecimento, de experiência ou de bom senso, tornando-os amplamente qualificados sem grandes esforços.

Outro dia os nomes de Copérnico e de Galileu foram mencionados nas redes sociais. Queriam compará-los aos que seguem os “novos conhecimentos” e que  são desacreditados por aqueles que defendem o conhecimento vigente…PASMEM!!! Utilizar o nome de um dos criadores do método científico para descreditar o próprio método científico….tenha santa paciência!

Há algum tempo atrás, eu relatei que havia gostado muito de um livro do astrônomo Carl Sagan.  Um livro indispensável para todos aqueles que buscam a verdade: “O Mundo assombrado pelos demônios: A ciência vista como uma vela no escuro”. Abaixo eu transcrevo uma passagem interessantíssima sobre a história do Dragão de Sagan, espero que vocês gostem…um abraço a todos,

 

R.Martins

 

— Um dragão que cospe fogo pelas ventas vive na minha garagem.

Suponhamos (estou seguindo uma abordagem de terapia de grupo proposta pelo psicólogo Richard Franklin) que eu lhe faça seriamente essa afirmação. Com certeza você iria querer verificá-la, ver por si mesmo. São inumeráveis as histórias de dragões no decorrer dos séculos, mas não há evidências reais. Que oportunidade!

— Mostre-me — você diz. Eu o levo até a minha garagem. Você olha para dentro e vê uma escada de mão, latas de tinta vazias, um velho triciclo, mas nada de dragão.

— Onde está o dragão? – você pergunta.

— Oh, está ali — respondo, acenando vagamente. — Esqueci de lhe dizer que é um dragão invisível.

Você propõe espalhar farinha no chão da garagem para tornar visíveis as pegadas do dragão.

— Boa ideia — digo eu —, mas esse dragão flutua no ar.

Então você quer usar um sensor infravermelho para detectar o fogo invisível.

— Boa ideia, mas o fogo invisível é também desprovido de calor.

Você quer borrifar o dragão com tinta para tomá-lo visível.

— Boa ideia, só que é um dragão incorpóreo e a tinta não vai aderir.

E assim por diante. Eu me oponho a todo teste físico que você propõe com uma explicação especial de por que não vai funcionar.

Ora, qual é a diferença entre um dragão invisível, incorpóreo, flutuante, que cospe fogo atérmico, e um dragão inexistente? Se não há como refutar a minha afirmação, se nenhum experimento concebível vale contra ela, o que significa dizer que o meu dragão existe? A sua incapacidade de invalidar a minha hipótese não é absolutamente a mesma coisa que provar a veracidade dela. Alegações que não podem ser testadas, afirmações imunes a refutações não possuem caráter verídico, seja qual for o valor que possam ter por nos inspirar ou estimular nosso sentimento de admiração. O que estou pedindo a você é tão-somente que, em face da ausência de evidências, acredite na minha palavra.

A única coisa que você realmente descobriu com a minha insistência de que há um dragão na minha garagem é que algo estranho está se passando na minha mente. Você se perguntaria, já que nenhum teste físico se aplica, o que me fez acreditar nisso. A possibilidade de que foi sonho ou alucinação passaria certamente pela sua cabeça. Mas, nesse caso, por que eu levo a história tão a sério? Talvez eu precise de ajuda. Pelo menos, talvez eu tenha subestimado seriamente a falibilidade humana.

Apesar de nenhum dos testes ter funcionado, imagine que você queira ser escrupulosamente liberal. Você não rejeita de imediato a noção de que há um dragão que cospe fogo na minha garagem. Apenas deixa a ideia cozinhando em banho-maria. As evidências presentes são fortemente contrárias a ela, mas, se surgirem novos dados, você está pronto a examiná-los para ver se são convincentes. Decerto não é correto de minha parte ficar ofendido por não acreditarem em mim; ou criticá-lo por ser chato e sem imaginação — só porque você apresentou o veredicto escocês de “não comprovado”.

Imagine que as coisas tivessem acontecido de outra maneira. O dragão é invisível, certo, mas aparecem pegadas na farinha enquanto você observa. O seu detector infravermelho lê dados fora da escala. A tinta borrifada revela um espinhaço denteado oscilando à sua frente. Por mais cético que você pudesse ser a respeito da existência dos dragões — ainda mais dragões invisíveis —, teria de reconhecer que existe alguma coisa no ar, e que de forma preliminar ela é compatível com um dragão invisível que cospe fogo pelas ventas.

Agora outro roteiro: vamos supor que não seja apenas eu. Vamos supor que vários conhecidos seus, inclusive pessoas que você tem certeza de que não se conhecem, lhe dizem que há dragões nas suas garagens — mas, em todos os casos, a evidência é enlouquecedoramente impalpável. Todos nós admitimos nossa perturbação quando ficamos tomados por uma convicção tão estranha e tão mal sustentada pela evidência física. Nenhum de nós é lunático. Especulamos sobre o que isso significaria, caso dragões invisíveis estivessem realmente se escondendo nas garagens em todo o mundo, e nós, humanos, só agora estivéssemos percebendo. Eu gostaria que não fosse verdade, acredite. Mas talvez todos aqueles antigos mitos europeus e chineses sobre dragões não fossem mitos afinal…

Motivo de satisfação, algumas pegadas compatíveis com o tamanho de um dragão são agora noticiadas. Mas elas nunca surgem quando um cético está observando. Outra explicação se apresenta: sob exame cuidadoso, parece claro que podem ter sido simuladas. Outro crente nos dragões aparece com um dedo queimado e atribui a queimadura a uma rara manifestação física do sopro ardente do animal. Porém, mais uma vez, existem outras possibilidades. Sabemos que há várias maneiras de queimar os dedos além do sopro de dragões invisíveis. Essa “evidência” — por mais importante que seja para os defensores da existência do dragão — está longe de ser convincente. De novo, a única abordagem sensata é rejeitar em princípio a hipótese do dragão, manter-se receptivo a futuros dados físicos e perguntar-se qual poderia ser a razão para tantas pessoas aparentemente normais e sensatas partilharem a mesma delusão estranha.


Bráquetes autoligáveis promovem uma retração mais rápida?

Boa Noite,

 

Tivemos um artigo nosso recém publicado on-line na revista The Angle Orthodontist, com o título: “Canine retraction and anchorage loss: Self-ligating versus conventional brackets in a randomized split-mouth study” e que pode ser abaixado pelo seguinte link: http://www.angle.org/doi/pdf/10.2319/100813-743.1 Esse artigo traz um nível de evidência altíssimo pois é um ensaio clínico randomizado e tem um desenho “split-mouth” onde o grupo controle é individual de cada paciente.

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Hoje eu gostaria de falar sobre esse artigo e contar como ele se desenvolveu, e também explicar algumas nuances dos resultados. O Dr. André Monini foi o principal investigador, e eu me lembro que recém da minha volta do EUA, do doutorado sanduíche em 2007, eu estava cheio de idéias e querendo pô-las em prática. O Dr. André estava planejando o seu projeto de doutorado que inicialmente seria de comparar clinicamente a retração de casos extração trazendo os caninos primeiro e depois os incisivos versus retrair os seis dentes anteriores.

Na saída da UNESP, um dia conversamos sobre pegar os pacientes do grupo onde seriam retraídos só os caninos  (que foram randomizados) e fazer um ensaio split-mouth com bráquetes autoligáveis e convencionais. Esse tipo de ensaio tem um poder muito grande de fazer comparações em torno do assunto movimentação dentária, pois a variabilidade individual da velocidade de movimentação dentária é enorme. Vide a tabela abaixo do artigo (que mostra individualmente todos os pacientes tratados, como gosta meu amigo Câmara):Capture43

Observe o paciente 6 que teve uma média mensal de retração ao redor de 0,4 mm/mês e o paciente 7, que teve uma retração com média de 1,2 mm/mês…3 vezes mais rápido.

Mas ai começaram as perguntas de como faríamos o ensaio para que os resultados obtidos fossem os mais válidos possíveis, pois não tínhamos o menor interesse em provar ou desprovar qualquer coisa. Estávamos preocupados primeiro em saber, para poder afirmar X ou Y com certeza, e em segundo lugar, preocupados em realizar uma pesquisa onde todos os aspectos que poderiam ser questionados (e que poderiam comprometer os resultados e a publicação em uma boa revista) estivessem cobertos.

Íriamos usar barra palatina para não comprometer a ancoragem? Não, pois como já publiquei no SMARTODONTICS, fiz uma revisão por curiosidade, nos EUA em 2006, e as evidências apontam para um ineficiência da BP para esse propósito.

Utilizaríamos elásticos em cadeia para a retração? Não pois é difícil de padronizar a força.

Quais bráquetes AL e Conv. iríamos utilizar? Nesse caso a preocupação não foi saber se era passivo ou ativo, mas a preocupação era de ter bráquetes com o mesmo tamanho pois sabemos que isso pode interferir no atrito (bráquetes menores geram mais atrito pois as forças normais são maiores). No Brasil na época haviam poucos bráquetes AL, e optamos por usar o da GAC, pois o inovation (AL) tinha um tamanho da canaleta horizontal bem parecido com o a tamanho do ovation (Conv,) e eram do mesmo fabricante.

As idades, a quantidade de apinhamento e outros fatores que podem influenciar a velocidade de uma pessoa em relação a outra eram fatores controlados pelo desenho “split-mouth” (onde o grupo experimental e controle estão dentro de cada pessoa) e pelo teste estatístico pareado que seria utilizado (T, caso os dados estivessem normais). Os lados do paciente e do ortodontista não teriam influencias pois foram radomizados.

Como iríamos medir? Usamos a metodologia de radiografias obliquas em 45o, que eu já havia utilizado em duas publicações minhas em 2009 no AJODO (Changes over time in canine retraction: An implant study e Group A T-loop for differential moment mechanics: An implant study).

Qual plano de referencia usaríamos? Muita gente pensaria em utilizar o plano SN ou Frankfort, mas esses são os menos piores para avaliar mudanças esqueléticas. Para examinar mudanças dentárias, a referência frente ao plano oclusal do inicio da retração é muito melhor; sem contar que ela padroniza os pacientes com planos oclusais diferentes, pois os dentes se movimentam pelo fio ortodôntico (paralelo ao plano oclusal).

E por ai vai…conseguimos controlar bem as variáveis, na minha humilde opinião.

Agora quanto ao artigo (recomendo que vocês o leiam antes):

O primeiro aspecto interessante é em relação ao tamanho da amostra e da randomização. Calculamos o tamanho da amostra considerando que uma diferença de 0,2 mm por mês entre os bráquetes (se ela existisse) seria clinicamente relevante e o retiramos o desvio padrão para movimentação dentária de artigos já publicados. O resultado do cálculo foi que 25 pacientes seriam necessários para ter uma certeza de 95%, caso encontrássemos uma diferença entre os grupos, e de 90% caso não a encontrássemos. O mais interessante é que a diferença encontrada entre os grupos foi de 0,003 mm/mês e insignificante do ponto de vista estatístico ( o erro padrão era de 0,07).

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Como não foi encontrada diferença entre os grupos e a diferença entre as médias e desvios padrões foram diferentes dos utilizados por nós para o cálculo da amostra, a nossa certeza de que a diferença entre os grupos não existe (poder) caiu muito (5%) e para termos uma certeza de 90% precisaríamos ter uns 250 pacientes na amostra.

Esse é um prato cheio para quem não entende de pesquisa e fica falando de tamanho de amostra sem saber das coisas direito.

“Ah, então como você só tem 5 % de certeza que está certo, os autoligáveis podem ser mais rápidos então? Essa pesquisa não é boa! (com tom de sarcasmo)”

A resposta:  “Lógico que não…a certeza diz respeito em DETERMINAR se o valor de 0,003 mm/mês encontrado é diferente de zero ou não (do ponto de vista estatístico).”

Aumento de amostra tem mais a ver com diminuição de intervalo de confiança (da variação entre os pacientes) do que com mudança das médias encontradas (se a randomização for boa, ela cuida para que as médias não se modifiquem significantemente com o aumento da amostra).

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Mas eu posso ser chato,  e supor que com 250 pacientes nós conseguiríamos determinar que realmente há uma diferença entre os grupos de 0,003 mm (que é clinicamente insignificante). Sinto desapontar alguns, mas essa diferença vai em favor dos bráquetes convencionais.

Mas como eu não vou ser chato (o que é difícil), eu acho que realmente não há diferenças…rs!

Para terminar, eu gostaria de traduzir uma última parte do artigo para reflexão, que diz respeito ao FATO de que a variação individual dos nossos pacientes é infinitamente mais importante do que se o bráquete é AL ou não; ou pelo menos 30 vezes mais importante, se a diferença de 0,003 mm/mês existir mesmo em favor dos convencionais:

“… a velocidade de movimentação dos caninos parece ser influenciada mais pelas respostas biológicas individuais dos pacientes do que pelo tipo de bráquete.  Sem um controle das respostas biológicas que ocorrem após uma força ser  aplicada a um dente, será muito difícil observar velocidades maiores de movimentação no futuro.”(Monini et al. Angle Orthod.,2014)

 

Um abraço,

R.Martins


Removendo Bráquetes de Safira: Missão para faixa preta

“A remoção de bráquetes de safira é um procedimento simples e rápido.”

“- Esse cara é louco!” – vocês devem estar pensando… – “Volta e meia eu tenho tirar esses bráquetes, e eles se quebram inteiros. Daí eu preciso pegar uma broca diamantada e gastar um tempão para desgastar toda a safira…”

 

Bom, mas as coisas não são por ai. Nem pense em usar o seu alicate de remoção do dia a dia para essa tarefa, pois ai sim o trabalho fica difícil.

Existem três maneiras de se remover esses bráquetes, entretanto elas dependem de você ter as ferramentas adequadas para a tarefa. Eu, particularmente, utilizo o terceiro método, o primeiro abaixo eu conto só por motivos históricos.

 

1-      Alicate de plástico e “Waffle”

Essa técnica só conhece que utilizou os bráquetes de safira da Ormco (primeiro veio o Inspire e depois o Inspire Ice) há mais de 8-9 anos atrás quando eles vinham com um kit para removê-los. Hoje por motivos econômicos (acho eu) o kit não vem mais junto com a boca, mas eu acredito que vocês ainda possam comprá-lo.

Nesse kit vinha um alicate de plástico para a remoção, que se encaixava bem ao redor do bráquete, um “waffle” de cera e um manualzinho 

Por haver uma falha proposital na malha de zircônia do bráquete, você poderia fraturar a interface (malha de zircônia)/corpo do bráquete (safira) fazendo um movimento no sentido oposto da oclusão (onde estava a falha). Assim o bráquete era removido.

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O grande problema é que a força de adesão do Inspire Ice é muito alta e você corre o risco de avulsionar um dente ao tentar remover o bráquete desta forma. Por esse motivo o “waffle” de cera bem rígida era fornecido. O paciente mordia o “waffle” enquanto você removia os bráquetes. Isso mantinha os dentes imóveis durante a remoção e diminuía a possibilidade de acidentes (….wow…).

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O segundo problema era que o alicate mal resistia a remoção de uma arcada de bráquetes e praticamente se desfazia. O terceiro é que se o bráquete estivesse quebrado você não conseguia removê-lo. Aí você teria que passar a segunda técnica abaixo ou ter que ficar alguns minutos desgastando os bráquetes com uma broca diamantada.

Coisa bruta e medieval, mais funcionava bem.

OBS. Parei de usar o Inspire ao redor de 2006 por causa da adesão excessiva.

 

2-      Alicate de corte de amarrilho.

Você pode utilizar um corte de amarrilho robusto e afiado para entrar entre o dente e a malha do bráquete e apertá-lo, de forma que você frature a interface da malha de zircônia e corpo do bráquete. Essa forma de remoção é boa, inclusive para quando os bráquetes estão fraturados, mas a desvantagem é que você precisa praticamente estragar um alicate bom e dependendo da posição dos bráquetes e dos dentes, devido a angulação de segurar o alicate, fica difícil utilizá-la.

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OBS: Os bráquetes também costumam a voar, estão não se esqueçam do óculos de proteção.

 

3 – Alicate da HT corp. (Eu removo desta forma)

A Orthometric do Brasil importa um alicate da HT Corp. que é específico para a remoção dos bráquetes de safira. Ele consegue segurar os bráquetes sem que eles fraturem (o que vai acontecer se você utilizar alicates de remoção convencional). A partir daí fica fácil de removê-los, mesmo se eles estiverem parcialmente quebrados.

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Os bráquetes de safira de hoje, como o In Ceram-S (Orthometric), possuem uma adesão mais adequada para a sua utilização, diferente do Inspire da Ormco onde a alta força de adesão torna a remoção perigosa.  Assim sendo, com esse alicate eu consigo remover os bráquetes inteiros com um movimento leve de rotação de punho sem causar nenhum problema ao paciente e sem possíveis acidentes

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Abaixo vocês podem ver o alicate em ação, removendo um bráquete quebrado de um paciente meu. Ele bateu os incisivos na borda da piscina…(ouch) e quebrou os bráquetes dos centrais.

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OBS. O paciente está bem, não houve lesões aparentes, e estamos fazendo o controle dos incisivos.

 

Abraço,

 

R.Martins


Como não fazer uma ortodontia baseada em evidências

Boa Noite,

Hoje resolvi ser cômico e exercitar meu humor ácido. Abaixo compilei as 15 regras de como não fazer uma ortodontia baseada em evidências:

 

1- Não leia nenhum artigo científico, isso é coisa para quem fez mestrado. Se for impossível escapar da leitura, fuja do tal de pubmed. Dê preferência a livros baratinhos ou a artigos com várias fotos (quanto mais melhor). Eles não precisam ser clínicos e nem ter um grupo controle, descarte os que contiverem a palavra “aleatório”. Caso seja impossível fugir do pubmed, continue se mantendo forte, dê a desculpa que você não tem acesso a eles porque não fala inglês;

2 – Se alguém te convencer a ler artigos indexados (esses do tal de pubmed), leia somente as conclusões dos resumos e lembre-se que quanto mais famoso for o autor mais chance você tem de as informações estarem corretas;

3- Se algum artigo científico clínico randomizado discordar de alguma coisa que você faça ou pensa, não dê bola…sua vivência clínica é sempre soberana (mesmo que você tenha poucos casos). Procure sempre falhas nesses artigos, lembrando-se sempre que o ataque é a melhor defesa. Ao não encontrar falhas, utilize as seguintes frases sempre que puder: “Esse artigo é antigo”, “Mas isso é só uma média”, ou “A amostra é pequena”…essa última sempre dá certo.

4 – Se algum artigo científico clínico randomizado concordar com o que você pensa ou costuma fazer, esqueça da regra 3. Faça várias cópias e distribua para amigos e pacientes;

5 – Entre um paciente e outro, no consultório, ou nos momentos de estudo, leia ti-ti-ti ou assista ao big brother. Ler artigos científicos é para quem ainda é novo e precisa estudar. Aliás, custa meio caro assinar essas revistas, gaste seu dinheiro de outra maneira mais prazerosa.

6 – Procure informações sobre novos bráquetes e fios nas brochuras dos próprios fabricantes, a informação é mais simples de ler e vem em uma linguagem “que a gente entende”. Caso precise de informações mais aprofundadas, mande um e-mail para a NASA.

7 – Faça amizade com os vendedores e siga seus conselhos regularmente, eles com certeza estudaram ortodontia mais que você. Essa amizade pode render frutos fazendo com que você diminua o gasto com materiais supérfluos. Alias, sempre se lembre que o vendedor não ganha dinheiro vendendo material. Devido a essa amizade, você pode ganhar materiais que vão mudar “paradigmas”, e portanto, não pense duas vezes antes de testá-los sem maiores informações. Tenha em mente que o consultório não serve para ganhar dinheiro mesmo;

8 – Se não houver respaldo científico para algum material novo ou procedimento que você tenha visto no facebook, esqueça que você é dentista…na ortodontia as matérias básicas não se aplicam. Se eu, com meu conhecimento das áreas biológicas, acredito que um shampoo vai fazer com que minha careca melhore, o que tem de mais eu acreditar num aparelho milagroso?

9 – Não vá em congressos patrocinados pelas associações reconhecidamente sérias, como ABOR ou AAO, esses são os mais perigosos. Caso você passe por um momento de fraqueza, vá…tire uma foto na entrada, adicione-a no site do consultório e vá passear na parte comercial ou mesmo fora do congresso (só tonto paga essas adesões);

10 – Não seja crítico com seus casos do consultório, aliás, você nunca terminou um caso mal. Os que ocorreram, na grande maioria, foram culpa do paciente;

11 – Não peça documentação final e não analise seu resultados. É óbvio que aquele protrator mandíbular que você instalou em um paciente adulto e hiperdivergente fez a mandíbula “remodelar” para anterior. Confirmar o que ocorreu é só para quem duvida das verdades.

12 – Se algum aparelho não funcionou da maneira esperada (o que é sempre exceção), não foi rápido, não fez o queixo crescer ou não resolveu o problema. Nunca, mas nunca mesmo considere a idéia de que você está simplesmente errado. Existem inúmeras outras pessoas para culpar;

13 – Não utilize os vários exames existentes para fazer um diagnóstico de qualidade, isso é coisa de DDS (dentista do dedo seco). Sigas as regras básicas: Nunca extraia (isso é coisa do passado), nem em Classe I e nem em Classes II, somente alinhe, nivele e use elásticos. Nunca recole um bráquete (propositalmente, é claro). Nos casos Classe III, tente sempre dar aquela “melhoradinha”. Não faça desgaste interproximal. Nunca utilize um AEB (também é coisa do passado). Por fim, não se aflija com essas informações, nós no Brasil somos menos invasivos e fazemos a melhor ortodontia do mundo.

14 – Ao se deparar com incógnitas, não pesquise a literatura, pergunte para alguém no facebook (mas muito cuidado, sempre nos grupos fechados). Lá você sempre sabe com quem está conversando e terá a resposta de autoridades no assunto.

15 – Lembre-se de que a fé em uma opinião ou em uma experiência pessoal traz mais informações do que a ciência, assim você pode obter resultados mais confiáveis e reproduzíveis.

 

Risos ou não boa noite a todos,

 

R.Martins

 


Não precisa usar adesivo?

Boa Noite,

 

A demanda de tempo e o fim do ano infelizmente me fizeram deixar o SMARTODONTICS um pouco de lado, o que me deixou meio triste, pois eu estou gostando desse meu projeto de escrever e compartilhar.

Hoje, voltando de João Pessoa, após dar um curso de 3 dias para a turma de especialização da ABO de lá, finalmente encontrei algum tempo para voltar a escrever.

Durante o curso, que por sinal foi muito bom (os alunos foram muito aplicados, interessados e atenciosos), uma coisa me chamou atenção durante o “hands-on” de colagem de bráquetes.

Eu estava demonstrando o posicionamento dos laterais inferiores (que eu costumo colar dando inclinação distal de raiz) quando vi, sobre a mesa, uma resina ortodôntica que “supostamente” não necessita de adesivo. Eu sabia dessa dita cuja porque já havia visto alguns dos alunos de Araraquara utilizando-a e achando que estavam economizando; um, por ela ser mais barata e dois, por “não precisar de adesivo.”

Perguntei:

“Eu estou vendo vocês colarem os bráquetes nos modelos sem adesivo, mas vocês sabem que no paciente é necessário que se use um adesivo, né (sic)?”

A resposta foi a mesma dos meus alunos da Morada do Sol:

“Mas nas instruções dessa resina diz que não precisa.”

Ai, fiquei preocupado…pois a história da resina mágica estava se espalhando pelo Brasil. Eu então, expliquei para eles e tive a ideia de também fazê-lo para vocês, colegas leitores do Smartodontics, do porquê “PRECISA”.

 

A resina composta é feita a partir de componentes orgânicos (Bis-GMA), inorgânicos (sílica, quartz e outros) e de um agente de união (silano). A resina que utilizamos normalmente para a colagem de acessórios é uma pequena modificação da resina utilizada em restaurações, pois a última tem uma quantidade relativamente grande de compostos inorgânicos para dar a resistência necessária a uma restauração estável. O problema da alta concentração desses compostos, de maneira geral, é que a resina fica com um baixo potencial de escoamento dando a ela uma alta viscosidade (relativa, é claro).

O que ocorre é que a capacidade da resina permear o esmalte, desmineralizado por um ácido, fica dificultada. Assim, torna-se necessário a utilização de uma camada (extra-fina) de um composto bem menos viscoso (uma resina com pouco ou nada de carga inorgânica) para obter-se uma boa penetração ao esmalte antes da aplicação da resina composta sobre o dente.

Na ortodontia, uma resina de alta viscosidade impossibilita um escoamento adequado à malha dos bráquetes, diminuindo a sua resistência às forças mastigatórias e ortodônticas. Uma resina de baixa viscosidade, como é o caso das resinas “flow”, as quais possuem uma baixa quantidade (relativa) de compostos inorgânicos, pode ter um bom escoamento à malha dos bráquetes, mas leva a dois problemas. Primeiro, a resina fica menos resistente, tornando-se inadequada à colagem ortodôntica (como já mostrado na literatura, com aproximadamente metade da força de adesão de uma resina ortodôntica convencional), e segundo, os bráquetes deslizam durante a colagem, o que torna o posicionamento de acessórios um pesadelo em algumas clínicas.

Portanto, uma resina com média viscosidade é a ideal para a colagem ortodôntica. O problema é que não é fácil (e muito menos barato) produzir uma resina com uma quantidade suficientemente alta de compostos inorgânicos (o que torna a resina cara) e que tenha viscosidade adequada para penetrar na malha dos bráquetes, e que finalmente, ao mesmo tempo, mantenha os bráquetes em posição durante uma colagem. Algumas companhias estrangeiras conseguem produzir tais resinas e estas são as resinas de escolha na ortodontia, elas são poucas e relativamente mais caras.

Relembrado esse assunto, vamos a história do adesivo.

Ainda que uma resina de média viscosidade penetre na malha dos bráquetes, ela não consegue fazê-lo adequadamente no esmalte condicionado e, portanto, precisamos de um adesivo que o faça. Assim, pode-se obter uma colagem adequada, já que a literatura mostra que a força de adesão é menor quando o adesivo não é utilizado junto a resinas ortodônticas.

Mas não adianta diminuir a quantidade de carga da resina, tornando-a menos viscosa na intenção de pular a fase do adesivo (e tentar enganar o ortodontista desavisado), pois além dela ficar menos resistente em sua estrutura, a força de adesão também diminui. Até mesmo as resinas “flow”, que possuem uma baixíssima viscosidade mostram diferenças significativas de adesão quando adesivo é ou não utilizado.

Na minha honesta opinião, eu acho que a “vantagem” de não usar adesivo e ter uma resina ruim não é nada inteligente.

Portanto, HOJE, com as resinas que temos disponíveis para a colagem de bráquetes É NECESSÁRIO o uso de adesivo.

Resta portanto, aos fabricantes desses novos (ou velhos) materiais mostrarem resultados científicos que comprovem sua “bula”…mas acho que prefiro concluir com as palavras do Dr. Peter Buschang:

 

“Where does it say that these (orthodontic) companies can’t lie?”

 

Um abraço,

 

R.Martins